30 de novembro de 2008

Essa pessoa dava um livro

Minha vó fez 73 anos na quarta-feira passada. Passei os últimos 3 dias na casa dela. Eu amo a minha vó e admiro muito a pessoa que ela é. Eu já devo ter ouvido umas mil vezes todas as milhares de histórias de vida que ela tem pra contar. Não são poucas, mas não me canso de ouvi-lás.

Ela se casou aos 22 anos e ficou viúva aos 30. O marido dela morreu de repente, até hoje ninguém sabe ao certo a causa da sua morte. O que todo mundo sabe é que ele teve hemorragia interna, no estômago, e teve que ser enterrado às pressas, antes que o sangue começasse a sair por todos oríficios do seu corpo.

E assim, sem esperar, deixou minha vó e os cincos filhos, em Osasco. A vida deles tinha sido boa até então, mas depois da morte do meu vô, as coisas pioraram muito. Minha vó era uma quase analfabeta e teve que arrumar dois empregos para sustentar os filhos: o mais velho tinha 7 anos e o mais novo, somente alguns meses.

Todo dia, ela saía de casa rezando para que os filhos estivessem bem quando ela voltasse. Eles ficavam sozinhos e dependiam da ajuda de alguns poucos bons vizinhos. Aliás, eles dependiam dos outros para muita coisa. O dinheiro que a minha vó ganhava mal dava para comprar comida, todo resto era ganhado. Móveis, roupas, brinquedos, utensílios domésticos.

Moravam em uma casa de dois cômodos, com uma cama de casal e uma de solteiro, um sofá todo destruído e um banheiro do lado de fora, que minha vó mesma teve que construir quando o banheiro original despencou.

Como se não bastasse a situação em que se encontravam, ainda tinham que suportar gozações na escola, na vizinhança, na família. Era difícil ver a pobreza ser motivo de piada e aguentar as previsões dos familiares, que só faltavam fazer apostas para adivinhar qual dos filhos tornaria-se um marginal.

Superar a pobreza parece algo impossível em uma país como nosso. Nossa sociedade foi estruturada para manter os pobres no lugar onde estão: abaixo de todo o resto da população. Até hoje ninguém consegue entender como minha vó, com seus 5 filhos, conseguiu romper com tudo isso.

Há uns 5 anos, duas pessoas que ajudaram muito a minha vó nesse período (eles tinham um mercado, empregaram alguns dos filhos dela e sempre davam o que podia para eles) vieram visitá-la. Chegaram no endereço que minha tia tinha passado e ficaram em dúvida em qual casa chamariam: na casa simples, de quintal desarrumado, precisando de reforma ou na casa ao lado, grande, nova e com carro na garagem.

Chamaram na primeira. Nós ouvimos chamarem o nome da minha vó e fomos ver quem era. Quando a minha família saiu no portão da outra casa, a mulher começou a chorar. E não parava mais. Foi só depois de algum tempo que ela conseguiu falar.

“Nem nos meus melhores sonhos eu conseguiria imaginar uma mudança tão grande. Vocês parecem um milagre.”

Eu concordo. A minha vó é um grande milagre de 1,45m de altura.


3 comentários:

Talita disse...

lindo!

Sue Ellen disse...

que lindo! =)

Diegovj disse...

Ainda temos alguns milagres como esse vagando pelo mundo. Felizmente, né?

Bjos!