23 de novembro de 2009

Eu não tenho dó

Eu aprendi a não ter dó.


Tem gente que morre de dó quando vê alguém pedindo dinheiro na rua. Eu não tenho dó. Conheço pessoas da minha idade que mal tem o que comer e vivem de doação. Pessoas que na época da escola estavam na farra, aprontando, fumando e bebendo, enquanto eu e minhas amigas estudávamos. E enquanto eu estava acordando pra ir pra faculdade, às 5h40, elas estavam indo dormir. E depois, enquanto eu passava o dia todo fora de casa, trabalhando e estudando, elas estavam dormindo e coçando. O Dia todo.

Tem gente que morre de dó de quem mora na rua. Eu não tenho dó. Um tio da minha mãe vive assim, na linha da miséria. A família inteira já tentou ajudá-lo, levou ele pra morar junto, deu casa, comida e roupa lavada. E o que ele fez? Esmurrou a porta, roubou coisas e ainda ameaçou de morte o irmão de quase 70 anos. Ninguém aguentou e ele foi parar na rua. Às vezes, aparece em casa, pedindo comida. A gente dá. Dinheiro, nunca. Quando minha mãe perguntou porque ele não arrumava um emprego e ia viver dignamente, a resposta foi simples: sou feliz assim.

Tem gente que morre de dó de ver velhinho em asilo ou em casa de repouso. Eu não tenho dó. Meus avós paternos são simplesmente as pessoas mais ruins que eu conheci na minha vida. Junte todas as bruxas e madrastas de conto de fadas e você terá a minha vó. Quando eu era criança e ia na casa dela, ela escondia a comida que estava em cima da mesa. Ela já pegou a vassoura pra bater na minha mãe. Já me xingou e me expulsou da casa dela. O meu avô mal consegue andar sozinho - por causa do mal de parkinson - mas ainda tem força pra mandar meu pai pra puta que pariu. No aniversário de 80 anos dele, fizemos uma festinha surpresa com os filhos, netos e bisnetos. Depois do Parabéns, ele perguntou quando a gente ia embora, porque ele não aguentava mais aquela bagunça.

As aparências enganam, para o bem ou para o mal. Você olha um pobre coitado e fica com pena porque “ele não teve oportunidades” e acabou parando na rua. Olha dois velhinhos indefesos e fica morrendo de dó porque a família os abandonou. Mas só quem acompanha o caso de perto sabe o que realmente aconteceu e porque algumas pessoas tem uma vida miserável ou deprimento. Porque a gente é esperto e só conta a parte da história que nos favorece né?! Minha avó vive reclamando que os filhos não cuidam dela, os vizinhos vivem falando mal da minha família... mas ela nunca contou pros vizinhos que já expulsou os filhos de casa. E os vizinhos morrem de pena dela, mas ninguém nunca vai lá fazer uma visita, arrumar um almoço, saber se eles estão bem...

Dó?! Eu tenho de mim.


* Esse é meu Centésimo post \o/

2 comentários:

Lígia Francisco disse...

Eu tb tenho dó de vc! hehehe

Aline Câmara disse...

ah vá
:P